Uma das queixas mais comuns nos consultórios pediátricos é: ”Meu filho não quer comer”. A maioria dos pais, em algum momento, já passou por esta situação. Como pediatra, eu escuto frequentemente esta queixa, mas confesso que só comecei a compreender melhor o significado desta frase depois que tive minha filha. Há realmente dias em que a criança não quer comer.
Apesar de desesperador para nós pais, é importante lembrar que a recusa alimentar das crianças, em algumas épocas de suas vidas, é um comportamento perfeitamente normal. Na época da erupção dos dentinhos, por exemplo, as crianças tendem a recusar a alimentação.
O importante é descartar algum problema ou doença que esteja levando à falta de apetite. A inapetência ou falta de apetite pode ser classificada em dois tipos: a inapetência orgânica e a comportamental. O pediatra, ao distingui-las, vai indicar a melhor conduta em cada situação.
Inapetência Orgânica: ocorre quando há alguma doença ou carência de ferro, vitaminas ou de minerais. Neste caso, feito o diagnóstico e iniciado o tratamento, percebe-se claramente a melhora com o retorno do apetite. Se a criança está com dor de garganta ou de ouvidos, ela não consegue sugar, mastigar e engolir, mas com o tratamento ela começa a aceitar progressivamente melhor os alimentos.
Inapetência Comportamental: é como um “subterfúgio” que a criança utiliza para chamar a atenção dos pais ou conseguir atingir o seu objetivo. Neste caso a criança não apresenta doenças. Nesta situação, a criança é extremamente seletiva e escolhe o que quer comer. Ela pode simplesmente recusar a refeição, geralmente, querendo alguma guloseima no lugar.
A criança pode aprender a gostar de qualquer alimento. A mudança de hábito é sempre mais difícil e, por isso, é importante passar para nossos filhos hábitos saudáveis desde cedo. Costumo falar para os pais de meus pacientes que o sucesso de uma reeducação alimentar depende do esforço de toda a família, mas há uma grande compensação, porque, ao final, todos ganham em qualidade de vida e saúde.
A seguir, estão algumas questões que converso com os pais quando seus filhos saudáveis não querem comer:
Onde a criança faz suas refeições?
É importante que a criança se alimente no mesmo local, sentada à mesa. Não é adequado comer no quarto, na cama ou no sofá. O ambiente deve ser tranqüilo, com a TV desligada e sem brigas ou discussões. O horário também deve ser respeitado. A criança que tem as rotinas bem estabelecidas tende a se alimentar melhor.
Com quem a criança faz suas refeições?
Sempre é mais gostoso quando fazemos as refeições na companhia de alguém. Se não dá para ter todos reunidos no almoço, pelo menos no jantar é importante fazer a refeição em família. A criança se sente mais estimulada quando está se alimentando com os pais e os irmãos.
Qual a quantidade de comida que é servida para a criança?
Temos a tendência de encher o prato da criança, mas o ideal é colocar pouca comida no prato. Primeiro porque o estômago da criança é pequeno e se ela estiver em frente de uma “montanha” de comida pode se sentir desanimada com tamanha quantidade. É melhor servir pequenas porções e deixá-la repetir quando solicitar.
O que a criança come nos intervalos das refeições?
Qualquer bolachinha ou bala pode acabar com o apetite no almoço ou no jantar. Por isso é importante evitar que a criança “belisque” entre as refeições.
O que você faz quando a criança não quer comer?
Se a criança não aceitar bem uma refeição, não há motivo para grandes preocupações. Não é aconselhável forçar a criança a comer. Ela vai aceitar na próxima refeição. Não se deve substituir o almoço e o jantar por leite.
Também não precisa correr atrás da criança com o prato na mão ou fazer “aviãozinho”. Quando a fome voltar, pode-se adiantar um pouco a próxima refeição.
O que a criança toma durante as refeições?
O ideal é não oferecer muito líquido imediatamente antes ou durante as refeições. Líquidos ocupam no estômago o lugar da comida e a criança fica com a sensação de falta de fome.
Você experimenta a comida antes de oferecer à criança?
Às vezes, por zelo, as mães preparam a comidinha dos filhos separadamente e colocam pouco tempero e as crianças não aceitam porque a comida não tem gosto. Eu costumo falar para as mães de meus pacientes que estão começando a comer papinhas, que criança tem paladar e aprecia muito uma comida saborosa. Outra coisa que acaba com o apetite é a monotonia do cardápio. Variar ajuda a oferecer tipos diversos de nutrientes também.
O que a família costuma comer?
A criança é muito esperta e desde cedo já começa a observar o que os pais estão comendo. Se há sempre verduras e legumes à mesa, mesmo que ela não aceite a princípio, com o tempo ela vai ter curiosidade e vai seguir os hábitos da família. Se os pais têm hábito de comer frutas, os filhos vão aceitar melhor as frutas ao invés dos doces na sobremesa. Por isso, bons hábitos podem ser ensinados desde cedo e dar o exemplo é o primeiro passo.
Aparência conta?
Com certeza, o visual faz muita diferença. Um prato com os alimentos coloridos e bem arrumados já estimula o apetite infantil.
O que seu filho não aceita de jeito nenhum?
É importante respeitarmos o gosto da criança. Pode ser que ela não goste e tenha até aversão mesmo a determinado alimento. Isso é muito comum com as frutas. Mas como, felizmente, os gostos vão mudando, não desista e continue oferecendo aquele alimento, que a aceitação pode, de repente, acontecer.
Minha filha me contou o que a sua professora diz quando um aluno não quer experimentar uma determinada fruta: “Pelo menos dê um beijinho na fruta”. E assim, de beijinho em beijinho, com calma, paciência, persistência e carinho, podemos conseguir passar bons hábitos alimentares para nossos filhos.
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